[Estamos assistindo a uma imposição de uma ideologia e de uma ditadura de gênero. Em nome de defender uma pretensa minoria, vemos nomes como os do deputado Jean Wyllys e outros ativistas e militantes buscando calar as vozes discordantes. Neste artigo, o procurador da república Paulo Jacobina reflete sobre o tema e relembra que nenhuma militância, seja religiosa, seja filosófica, seja étnica,
seja sexual, pode pretender calar o adversário pela estratégia de
criminalizar o discurso divergente como fóbico, ou como fala de ódio a
ser eliminado juntamente com seus defensores].
Há uma pergunta que vem se impondo no atual contexto de luta
política, que é exatamente a pergunta sobre os limites, no âmbito da
sadia laicidade e do desejável pluralismo, da possibilidade de o Estado
impor determinada corrente ideológica ou filosófica como a única
aceitável no debate público, através do recurso à criminalização da
opinião oposta como “fobia” a ser erradicada em nome da proteção de
minorias.
Por isto, o grande problema da contemporaneidade não está nos
Estados confessionais. Há Estados confessionais marcados por grande
respeito à legítima pluralidade de ideias, como a Inglaterra e a Suécia;
ao lado disso, há Estados ateus onde o exercício da religião e da
liberdade de opinião é impossível, como a China e a Coreia do Norte. O
problema está, portanto, naqueles Estados em que há uma ideologia
oficial a ser promovida com exclusividade, de um lado, e a
criminalização e eliminação dos pensamentos objetores, de outro.
Nos verdadeiros Estados democráticos, confessionais ou não, deve
haver um concreto respeito à posição das minorias. Defendê-las das
posturas injustas de maiorias eventuais é algo perfeitamente
democrático. Mas valer-se da posse eventual de uma posição de poder
estatal para, em nome da defesa de minorias, criminalizar discordâncias
majoritárias sob o rótulo de “fobia” não é democrático. É estratégia de
reeducação social mediante imposição estatal.
Parece muito claro que num estado realmente pluralista nenhuma
militância, seja religiosa, seja filosófica, seja étnica, seja sexual,
pode pretender calar o adversário pela estratégia de criminalizar o
discurso divergente como “fóbico”, ou como “fala de ódio” a ser
eliminado juntamente com seus defensores. Por mais dolorido que seja,
democrático é aguentar não somente a discordância, mas a oposição
ideológica e até a avacalhação humorística, que deve ser resolvida no
campo dos debates francos.
Por isto, parte da reação islâmica no caso das caricaturas
anti-islâmicas que circularam em jornais na Europa foi perfeitamente
saudável. Manifestaram publicamente sua indignação contra o que viram
como o desrespeito à sua figura religiosa central. Mas minorias
islâmicas radicais recorreram até às ameaças de violência contra o que
viram como uma alegada “islamofobia” ocidental que deveria ser eliminada
da face da terra, juntamente com seus promotores. A categoria da
“fobia” foi utilizada, aí, por alguns extremistas que não representam a
maior parte do bom povo muçulmano, para pintar os adversários
religiosos como portadores de uma patologia moral ou religiosa maléfica,
a serem exterminados, inclusive fisicamente.
Há uma estratégia em curso, muito semelhante, no ocidente, com a
questão do comportamento sexual. Recentemente certas minorias sexuais
começaram a comportar-se como minorias religiosas radicais e erigiram,
como estratégia de combate político, a criminalização das opiniões
contrárias à sua própria mundividência como “fala de ódio”, usando
exatamente a mesma categoria de “fobia” já usada pelos radicais
muçulmanos como justificativa para calar seus adversários.
Muitos cidadãos de boa fé defendem versões atenuadas deste discurso,
sem perceber o que elas significam, no limite. Acreditam verdadeiramente
que a “eliminação de preconceitos sexuais” criará uma sociedade mais
plúrima e justa. Mas aqui não se trata de verdadeira “eliminação de
preconceitos”, perfeitamente desejável, mas da oficialização de uma
ideologia.
Para essa militância radical, não somente a prática ou o incitamento a
crimes contra homossexuais é considerado como “homofobia”, mas qualquer
posicionamento público, de cunho filosófico, científico ou religioso
que não parta dos mesmos pressupostos que as minorias sexuais usam para
ver-se e interpretar-se. Afirmar a possibilidade de que um ser humano
controle seus impulsos sexuais, ou mesmo um simples chamado à castidade,
à fidelidade, à responsabilidade com a prole e com o outro, a
valorização da abertura à vida na conduta sexual, em nome de religião ou
de aperfeiçoamento moral, ficariam classificados como “fala de ódio”,
“homofobia” e “intolerância” a serem combatidos e criminalizados pelo
Estado.
Sob o rótulo de “homofobia”, esses ativistas, que felizmente
representam apenas uma minoria radical, pleiteiam a vedação estatal da
discordância, com a elevação de sua ideologia a religião oficial do
Estado. Não se pode deixar de reparar que se trata de estratégia análoga
a do uso da categoria da “islamofobia” contra os cartunistas europeus,
no incidente acima citado.
Mais recentemente, a estratégia estendeu-se ao campo da educação, sob
a ideia de que a reprodução cultural da maioria jamais permitirá a
superação dos “preconceitos” contra as minorias. Assim, de repente,
mesmo algumas minorias que jamais quiseram prole tornaram-se ativas na
discussão da regulamentação estatal da educação da prole alheia.
Estas minorias desejam impor, portanto, como linha filosófica oficial
na política nacional de educação, a sua própria visão de
mundo, transformada em ideologia oficial de Estado: tornar-se-ia
obrigatório educar jovens e crianças em conformidade com o que eles
pensam sobre a promoção de uma “diversidade sexual” indiferente e
refratária a valores, a pretexto de “superação de preconceitos” contra
“minorias”.
Trato aqui dos ideólogos que tentam transformar em política oficial a
ideia nada científica e filosoficamente insustentável de que as pessoas
humanas têm uma “identidade sexual” totalmente dissociada da identidade
genital corporal. Para estes, a única forma aceitável de educação é
aquela que dissocie totalmente a corporalidade genital da identidade
sexual. Os defensores destas posições buscam educar crianças e jovens
para considerar igualmente desejáveis quaisquer tendências ou desejos
sexuais que um ser humano venha a desenvolver. Por mais bizarras que
tais tendências possam se apresentar à razão, à ciência, à filosofia e
às religiões, bem como ao conjunto da sociedade. Trata-se, também, de
impor como política oficial de Estado a ideia de que a única postura
lícita para educar crianças e jovens seria promover um direito absoluto
de dar livre curso a seus próprios apetites sexuais como sentido de
vida, transformando a sexualidade num verdadeiro culto religioso, em que
o deus é a libido e a pansexualidade, sua “imagem e semelhança” nos
seres humanos.
Por isto, os grupos de pressão que comungam dessa visão filosófica
estão lutando para fazer inserir em algum diploma legal a categoria da
“orientação sexual” como uma categoria definidora de “preconceitos
ilícitos a serem eliminados pelo estado brasileiro”, juntamente com os
preconceitos quanto à origem, raça, sexo, cor, idade (mencionados no
art. 3º, IV, da Constituição brasileira). A bola da vez é o Plano
Nacional de Educação.
Mas, qualquer que seja o documento legal que reconheça oficialmente
esta ideologia como está sendo proposta, teríamos por aqui algo
equivalente a uma "religião oficial de Estado”, esta "religião" do
“gênero”. De uma posição filosoficamente insustentável, como é hoje,
esta ideologia seria elevada a princípio estrutural de ação do Estado no
combate ao "preconceito". Sendo, como é, incompatível com todas as
outras correntes religiosas majoritárias no Brasil, a transformação da
ideologia de gênero em política de Estado, que vem sendo tentado com
sutileza, mas que encobre ideias e grupos muito radicais, é uma grave
ameaça à nossa democracia. Transforma pessoas com discordâncias
religiosas e morais em inimigos oficiais
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