Cristiano Falek
Faz tempo que não escrevo. Tenho pensado bastante
sobre diversas coisas na luta contra a atração pelo mesmo sexo (AMS), mas
especialmente, nestes últimos dias, tem me inquietado uma questão que,
certamente, incomoda alguns de nós que lutamos contra a AMS, senão todos. Qual
é o meu objetivo: superar a AMS ou ser santo? Buscar desenvolver atração pelo
sexo oposto ou me fazer santo apesar de ter ainda AMS?
Tenho percebido que temos duas tendências
atualmente, no meio cristão, especificamente no meio católico, ao encarar o
problema da AMS. A primeira é aquela que quer a todo custo a aceitação da
homossexualidade como uma variante normal da sexualidade humana e portanto
normatizá-la derrubando e passando por cima da Revelação Divina, inclusive
distorcendo-a em nome de uma pretensa felicidade. O segundo é a obsessão
calvinista pela superação da AMS, manifesta no meio protestante e herdada,
infelizmente por diversos movimentos na Igreja.
O primeiro grupo erra por querer adequar a fé e a moral aos seus impulsos sexuais, mas sobre esses erros já há quem milite, entretanto, o segundo erra por muitos outros motivos: por fugir do sofrimento, por negar o valor do sofrimento na vida cristã e por pretender que a tendência homossexual seja pecado, todos, como disse, erros herdados da doutrina calvinista; nada de católico há neste parecer.
Mas não é sobre isso que quero falar. O meu
propósito, como diz o título, era falar sobre qual é e deve ser o meu objetivo
enquanto pessoa que batalha contra a AMS.
É preciso, primeiramente, ter consciência de que
as pessoas que tem AMS são biologicamente normais, o que não é normal é o
exercício da homossexualidade, conforme afirma o Doutor Gerard Van den Aardweg,
bem como todos os estudiosos que trabalham no NARTH. Ao testemunho dos
especialistas se une a voz da Igreja. Ambos estão de acordo em condenar as
relações e os atos homossexuais como “intrinsecamente desordenados” (CIC §
2357) e fazer a justa distinção entre tendência e pessoa. Todavia, como afirma
Jorge Scala no seu livro ‘Ideologia de gênero: o neototalitarismo e a morte da família’ apesar de não existirem nem pessoas homossexuais, nem
heterossexuais (isso é criação dos ideólogos de gênero), mas tão somente homens
e mulheres, como Deus criou , alguns
enfrentam o complexo que se denomina atração pelo mesmo sexo, enquanto outros
não o enfrentam.
Entretanto, tudo isso dito acima parece ser
ignorado por muitos em razão duma busca de absoluta e imperiosa necessidade de
desenvolver atração pelo sexo oposto, como se a única coisa que atestasse uma
mudança na vida do individuo fosse fazer com que ele desenvolva atração pelo
sexo oposto .
O problema de encararmos a situação dessa forma
é “genitalizar” a
questão. Tomada a situação dessa forma, o individuo se torna refém da sua
genitalidade. Sabiamente o Padre Daniel Ange, no seu livro ‘Homossexual, quem é
você? Para onde você vai?’ aborda a questão e enfatiza que a pessoa com AMS
deve perceber a amplitude e a beleza do seu ser homem ou mulher, ser humano,
criado à imagem e semelhança de Deus, ser esse obra tão perfeita e maravilhosa,
que mereceu do salmista o apanágio: “Que é o homem, digo-me então, para
pensardes nele? Que são os filhos de Adão, para que vos ocupeis com eles?
Entretanto, vós o fizestes quase igual aos anjos, de glória e honra o coroastes”
(Sl 8, 5-6).
O teólogo alemão Dietrich von Hildebrand
no seu livro ‘Marriage: the mystery of faithful love’ nos lembra que “homem e
mulher são duas expressões diferentes da humanidade, ambos possuindo seu
significado respectivo de acordo com o plano divino, e seu valor especial
muito longe da sua função de procriação”.
Percebemos então que a amplitude de ser homem ou ser mulher não se restringe a
desejar o sexo oposto ou não, mas compreende viver de modo dialógico com o sexo oposto
enquanto ‘outro’, permitindo a si mesmo a
descoberta e o aprofundamento do mistério da masculinidade e/ou da feminilidade
que o leve a compreender que ambos foram
criados para se complementarem mutuamente; e também permitindo-se amar e
desejar a sua própria identidade, masculina ou feminina, de forma plena e integral
, de modo que o homem perceba-se como
tal, viva como tal, aja como tal, e o mesmo para a mulher. Todavia, a vivência
de tudo isso não implica necessariamente desenvolver atração pelo sexo oposto.
Mas como ensina a fé católica, o homem não
existe apenas em vista da sua genitalidade, ou seja, do exercício da
sexualidade por meio do ato sexual.
Desde os anos 1950, quando já se preparava o
advento da nefasta revolução sexual que se consolidou nos anos 1960, permeou a
sociedade um ideal desatinado de supervalorização do sexo em detrimento dos
valores do espírito. Muitos, infelizmente, transferem para as suas vidas e para
a sua luta contra a AMS esse desvio de valor, focalizando as energias exclusivamente
(ou prioritariamente) na superação da AMS, na ‘mudança da homo para a
heterossexualidade’. Quando olhamos a nossa luta por este viés, caímos naquele
triste erro denunciado por Peter Kreeft, no seu livro ‘Como vencer a guerra cultural’ de atribuir ao sexo um status
de algo absoluto e necessário, como Deus, à vida dos indivíduos no nosso tempo.
Mas, para mim, a fonte de vida
não é o sexo, mas Jesus Cristo, que disse de si mesmo: “Eu sou o caminho, a
verdade e a vida” (Jo 14,6). Dietrich von Hildebrand no seu livro citado anteriormente
afirma: “Certamente, o homem e a mulher têm, no final das contas, uma
única tarefa, ‘renascer em Cristo’, e glorificar a Deus pela sua santidade”.
Existe, portanto, um fim que importa
mais para a vida do homem do que fazer uso da sua genitalidade. Santo Inácio de
Loyola nos revela qual seja este fim e
como alcançá-lo, dizendo que “o homem é criado
para louvar, reverenciar e servir a Deus Nosso Senhor, e assim salvar a sua
alma. E as outras coisas sobre a face da terra são criadas para o homem, a fim
de ajudá-lo a alcançar o fim para o qual foi criado. [...] De tal maneira que, de nossa
parte, não queiramos mais saúde que doença, riqueza que pobreza, honra que
desonra, vida longa que breve, e assim por diante em tudo o mais, desejando e
escolhendo apenas o que mais nos conduzir ao fim para que fomos criados”.
Assim, o verdadeiro foco dos que lutam contra a
AMS, enquanto cristãos, deve ser, sobretudo, ser um ‘homem novo’ em Cristo e
despojar-se do homem velho. Nosso Senhor nos chamou todos a isso desde o inicio
da sua vida pública : “Convertei-vos e crede no evangelho” (Mc 1,15).
Essa conversão, a que somos todos chamados, engloba todos os aspectos da
nossa vida (e não apenas os problemas com atração pelo mesmo sexo, masturbação,
adicção sexual, ou um só aspecto em particular).
Focar-se somente na ‘mudança de homo para
hetero’ é para nós cristãos o mesmo que dar as costas Àquele que disse: “Eis
que eu faço novas todas as coisas” (Ap 21,5). Sem ser necessário abandonar
a esperança na restauração sexual, a luta deve estar focada na transformação de
si mesmo em Cristo (ou alter Christus),
pois, de outra forma, corremos o risco de cair na idolatria do sexo que Peter
Kreeft denuncia.
Por isso, a Igreja ensina que o homem e a mulher
que lutam contra a atração pelo mesmo sexo são chamados a “realizar a vontade
de Deus nas suas vidas” (CIC § 2358). A vontade de Deus para todos os homens é
a santidade, como testemunham tanto o Antigo quanto o Novo Testamento: “Sede
santos, porque eu, o Senhor vosso Deus, sou santo” (Lv 19,2) e “A
vontade de Deus é essa: a vossa santificação” (I Tes 4,3).
Isso seria uma atitude
comodista? Certamente que não! Uma
vez que a decisão de buscar a santidade for tomada, devemos ter consciência de
que se trata de um árduo trabalho. São Paulo mesmo diz aos filipenses: “Trabalhai na vossa salvação com temor e tremor”
(Fp 2,12). Portanto, a busca pela santidade é trabalho e trabalho duro.
Na medida em que buscamos a configuração a Cristo, em vida de
santidade, em obediência à vontade de Deus devemos confiar absolutamente na
Providência, conscientes de que aquele que confia em Deus sabe que “Ele
satisfará os desejos do teu coração” (Sl 36[37],4), na medida das
suas necessidades e em vista da própria salvação.
Isso significa que, se eu buscar a
santidade, eu necessariamente superarei a AMS? Pode ser que não. Mas superar a
AMS é absolutamente necessário para a nossa santificação? Certamente que não. Conto,
pois, um testemunho narrado num livro chamado ‘Peregrinos por el camino de la esperanza’ do Cardeal Van Thuan:
“‘Se convém para a minha salvação’: essa era a
restrição que punha um cego em todas as suas orações. Um dia, o levaram ante o
sepulcro de São Tomás de Canterbury, para pedir a sua cura. E se produziu o
milagre. Após os primeiros minutos de alegria, se lembrou que havia omitido a
sua restrição habitual. Voltou-se e repetiu sua oração, acrescentando ‘se a
cura convém para a minha salvação’. Subitamente voltou a ficar cego, mas, a
partir de então, sua vida se fez ainda mais virtuosa”
Este testemunho me lembra dum caso que eu
conheci pessoalmente. Eu e um rapaz amigo meu lutávamos contra a AMS e
nos ajudávamos. Ele, felizmente, desenvolveu atração pelo sexo oposto, não sei
bem exatamente como e, depois, conheceu uma moça, namorou e casou-se, mas
deixou de buscar a Deus voltando para uma vida de pecado e idolatria, crendo em
energias, mantras, etc.
Por isso, devemos ter em mente que quaisquer
conquistas alcançadas na busca de atração pelo sexo oposto, adquiridas num
individuo cujo coração não está orientado para a santidade, para viver e morrer
em Cristo e com Cristo, serão corrompidas
pela concupiscência de uma maneira viciosa – o que contraria totalmente o
chamado primordial do cristão que é morrer para o pecado e viver para Deus.
Importa que todos nós confiemos em Deus e nos
abandonemos em Suas mãos, como filhos Seus. Ele é um Bom Pai, que conhece
nossas necessidades. Ele não nos negará nada do que precisamos, Ele não nos
entregará à destruição e tudo nos dará segundo o melhor proveito, em tempo e
lugar favoráveis, pois como afirma o apóstolo São Paulo: “Aliás, sabemos que
todas as coisas concorrem para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são
os eleitos, segundo os seus desígnios” (Rm 8,28). Isso pode não significar
aquilo que queremos, mas será sempre o que é necessário para que possamos
vislumbrar aquele lugar que Deus preparou para os seus amados e ouvir o
convite: “Vinde, benditos de meu Pai,
tomai posse do Reino que vos está preparado desde a criação do mundo” (Mt
25,34).
Nosso Senhor, em diversos momentos da sua
pregação afirmou: “Buscai em primeiro lugar o Reino de Deus e a sua justiça
e todas as coisas vos serão dadas em acréscimo” (Mt 6,33) e também: “portanto,
sede perfeitos, assim como vosso Pai celeste é perfeito” (Mt 5,48) e ainda
em diversas outras parábolas, aponta o Reino dos Céus como uma meta a ser
desejada a cima de todas as coisas, como no caso do negociante de pérolas que
vende tudo para comprar o campo onde está um pérola preciosíssima.
E
portanto, para mim, cada dia fica mais claro qual o objetivo da minha busca, o
objetivo certo e verdadeiro. Deus quer a busca pela santidade preceda qualquer
outra coisa, porque a busca pela santidade não é nada mais, nada menos do que a
busca por ser íntimo d’Ele. É desejo de
Nosso Senhor que nos envolvamos de modo íntimo com Ele, levando uma vida
unida a Ele, como o ramo à videira. E como disse Ele, “todas as coisas vos
serão dadas por acréscimo” (Mt 6,33). Buscando primeiro as coisas do alto, obtemos primeiro o que
realmente precisamos. Tudo mais será lucro.
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